Leitura de História

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Uma Breve História do Califado: 632 d.C. – Presente

Em 29 de junho de 2014, o líder do Estado Islâmico do Iraque e da Síria (ISIS), Abu Bakr Al-Baghdadi, proclamou-se califa. Este anúncio ressuscitou o califado como uma entidade física, dominando as manchetes ao redor do mundo. Diante disso, surgem várias questões: o que é um califado em termos históricos, e este novo estado pode realmente reivindicar esse título? Esta nova era anuncia uma unidade islâmica ou apenas aprofunda as divisões existentes? Para entender essas questões, é essencial analisar a história do califado, tanto como um conceito quanto como um estado real.

O califado não é apenas uma instituição política, mas também um símbolo duradouro de autoridade religiosa e legal. Seu valor simbólico tornou o restabelecimento do califado um objetivo central para grupos fundamentalistas como a Al-Qaeda e ISIS, uma herança do passado que ainda ecoa nos dias de hoje.

Os Herdeiros de Maomé e a Origem do Califado: 632 – 1452

Após a morte de Maomé em 632, a comunidade muçulmana escolheu Abu Bakr, sogro do Profeta, como seu líder, tornando-se o primeiro califa. Abu Bakr herdou a liderança religiosa e política de Maomé, estabelecendo um precedente que se desenvolveu no título completo de Califa. Este título também se tornou hereditário com a ascensão de Muawiya ibn Abi Sufyan em 661, fundador da dinastia Omíada.

Desde o início, o califado foi uma instituição política e religiosa fundamental no mundo islâmico. A autoridade do califa era frequentemente justificada pelo 55º versículo da “Sura Al-Nur [24:55], que se refere aos “Califas” como instrumentos de Alá. Sob o governo abássida no século IX, o califado viveu sua idade de ouro, com territórios que se estendiam do Marrocos à Índia. No entanto, em 1258, a invasão mongol liderada por Hulagu Khan resultou no colapso da dinastia abássida, fragmentando o mundo islâmico em reinos menores que aspiravam ao título de califa.

O Califado 632 – 655.
O Califado 632 – 655.

O Último Califado: O Império Otomano: 1453 – 1924

Em 1453, o sultão Mehmet II consolidou os turcos otomanos como a principal potência sunita ao conquistar Constantinopla. No entanto, o Império Otomano só se tornou um califado ao adquirir os lugares sagrados do Islã (Meca, Medina e Jerusalém) dos mamelucos egípcios em 1517. Com a incorporação do Egito e do coração da Arábia, os otomanos puderam reivindicar a supremacia religiosa e militar no mundo sunita.

Os otomanos mantiveram sua liderança até serem desmantelados pelos impérios europeus. O declínio do califado e a ascensão do imperialismo europeu resultaram na absorção de vastas áreas do mundo muçulmano pela maquinaria colonial. Tentativas de modernização, como as reformas militares de Selim III, ou políticas para revitalizar o califado, como a propaganda de Abdulhamid II, marcaram os últimos anos do império. A derrota na Primeira Guerra Mundial e a ascensão dos nacionalistas liderados por Mustafa Kemal Atatürk resultaram na extinção do califado.

Secularismo e Pós-Colonialismo: O Fim do Califado: 1923/24

Após a assinatura do Tratado de Lausanne em 1923, o Império Otomano transformou-se na República da Turquia. Apesar da extinção do sultanato, o califa Abdulmecid II manteve um valor puramente simbólico. Dois movimentos opostos, nascidos da interação com as nações europeias, lutaram pela defesa ou dissolução do califado: o movimento Khilafat na Índia, que buscava proteger o califado, e os nacionalistas turcos, que apoiavam a abolição completa do califado e a criação de um estado secular.

O programa secular de Atatürk aboliu o califado em 1924, encerrando um sistema que governou o mundo sunita desde a morte de Maomé em 632.

Os Descendentes do Califa: Pan-Arabismo e Pan-Islamismo após 1924

As fronteiras do Oriente Médio, traçadas pelas potências coloniais, não refletem a realidade cultural, étnica ou religiosa da região. A descolonização criou nações sem identidade ou homogeneidade, compensadas por um passado dourado de civilização árabe ou muçulmana unificada. A derrubada do último califa em 1924 resultou em uma divisão ideológica entre uma versão purificada e anti-ocidental do Islã e um movimento secularista e pró-socialista.

O presidente egípcio Gamal Abdel Nasser liderou o movimento pan-árabe, uma mistura de socialismo e nacionalismo secular. O pan-islamismo surgiu como uma alternativa, unificando o mundo muçulmano com base na religião islâmica, especialmente após a queda da União Soviética e o enfraquecimento do pan-arabismo.

O califado, enquanto existiu, representou a unidade do Islã. Sua abolição deixou um vácuo no mundo islâmico, um sonho radical revivido com a proclamação do califado pelo Estado Islâmico em 2014. Este evento simboliza a persistência de ideais históricos e a contínua busca por unidade dentro do mundo muçulmano.

A fumaça sobe dos tanques de petróleo ao lado do Canal de Suez durante o ataque inicial anglo-francês a Port Said, em 5 de novembro de 1956.
A fumaça sobe dos tanques de petróleo ao lado do Canal de Suez durante o ataque inicial anglo-francês a Port Said, em 5 de novembro de 1956.

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