Entre 1292 e 1295, nasceram três mulheres que, além de serem netas do rei Eduardo I da Inglaterra, eram também filhas do proeminente nobre Gilbert ‘o Vermelho’ de Clare, Conde de Gloucester e Hertford. As irmãs Clare, com seus destinos entrelaçados de maneira significativa na história inglesa, tiveram uma vida marcada por reviravoltas dramáticas e conflitos de poder.
O Legado de Gilbert de Clare
Gilbert de Clare faleceu em dezembro de 1295, deixando um legado considerável e uma família complexa. Seu filho mais novo, Gilbert, com apenas quatro anos, herdou as vastas propriedades do pai, que abrangiam áreas significativas na Inglaterra, País de Gales e Irlanda. Além dele, a esposa de Gilbert também deixou três filhas pequenas: Eleanor, com três anos; Margaret, com cerca de 18 meses; e Elizabeth, a mais jovem, com apenas algumas semanas de vida. O futuro dessas jovens seria profundamente influenciado pelas intrigas políticas e rivalidades de sua época.
Primeiros Casamentos e Desafios
O casamento de Eleanor foi arranjado pelo avô Eduardo I em maio de 1306 com Hugh Despenser, um jovem nobre e neto do falecido conde de Warwick. A morte de Eduardo I em 1307 trouxe mudanças drásticas, pois seu filho de 23 anos, Eduardo II, sucedeu-o no trono. Eduardo II, conhecido por seu envolvimento com o nobre gascon Piers Gaveston, não apenas era um rei controverso, mas também rearranjou as alianças familiares de forma inesperada. Em novembro de 1307, Gaveston casou-se com Margaret de Clare, e em 1308, Elizabeth se casou com John de Burgh, herdeiro do conde de Ulster, mudando-se para a Irlanda em 1309.
Elizabeth, entretanto, enfrentou a tragédia em 1313 quando ficou viúva, com seu filho William de Burgh, futuro conde de Ulster, ainda bebê. Margaret também se tornou viúva jovem após a morte de Gaveston em junho de 1312, em um episódio dramático causado por barões descontentes com a influência de Gaveston sobre Eduardo II.
Mudanças de Fortuna e Acontecimentos Políticos
O ano de 1314 trouxe uma nova onda de turbulência para as irmãs Clare. Gilbert, o irmão mais velho das irmãs e conde de Gloucester, morreu na Batalha de Bannockburn, em junho de 1314. Com sua morte, suas irmãs se tornaram co-herdeiras de um terço de suas vastas propriedades, aumentando significativamente sua riqueza e influência. No entanto, a instabilidade política na Inglaterra afetou profundamente suas vidas.
Eduardo II, buscando consolidar seu poder e garantir a lealdade de seus parentes próximos, organizou os casamentos de Margaret e Elizabeth com dois dos seus favoritos, Sir Hugh Audley e Sir Roger Damory, em abril de 1317. Essas alianças, no entanto, não duraram. Hugh Despenser, agora camareiro do rei em 1318, usou sua posição para ganhar influência considerável e derrubar os favoritos anteriores do rei. Despenser e Eduardo II desenvolveram uma relação cada vez mais próxima, com Despenser se tornando o principal “favorito” de Eduardo II, governando efetivamente a Inglaterra de 1319 até sua execução em 1326.
Conflito e Queda dos Clare
Os maridos de Margaret e Elizabeth, Hugh Audley e Roger Damory, se envolveram em uma tentativa malsucedida de rebelião contra Eduardo II e Despenser em 1321/22. Audley foi preso e Damory morreu lutando contra as forças reais. Como resultado, Eduardo II enviou Margaret para o cativeiro em Sempringham Priory, em Lincolnshire, e Elizabeth foi aprisionada na Abadia de Barking, em Essex, antes de ser libertada. Apesar de sua liberação, Elizabeth enfrentou a perda de parte de suas terras para Despenser e protestou publicamente contra o tratamento que recebeu.
O Novo Favorito do Rei e as Consequências
Durante o reinado de Eduardo II, Eleanor de Clare, a irmã mais velha, manteve uma posição elevada, embora rumores circulassem sobre um relacionamento íntimo com o rei. Em 1326, cronistas afirmaram que Eduardo II tratava Eleanor com grande favor, enquanto sua esposa, Isabel da França, estava ausente na França. Despenser, o favorito do rei, acumulou poder e riqueza, e sua influência levou à execução de Isabel e à sua própria queda.
A resposta de Isabel foi decisiva: ela formou uma aliança com os inimigos baroniais de Eduardo II e invadiu a Inglaterra, executando Hugh Despenser e forçando Eduardo II a abdicar em favor de seu filho, Eduardo III, em janeiro de 1327. Nesse cenário turbulento, Eleanor de Clare foi presa na Torre de Londres por 15 meses, enquanto Margaret foi libertada de Sempringham e Elizabeth recuperou suas terras.
O Pós-Reinado e o Legado das Irmãs Clare
Após a deposição de Eduardo II, a rainha Isabel, agora regente em nome de seu filho Eduardo III, aproveitou a oportunidade para consolidar o poder, privando Eleanor de suas propriedades e concedendo-as a si mesma e à rainha Philippa de Hainault. Eleanor foi posteriormente casada à força com William la Zouche, e sua vida passou a ser marcada por uma série de reveses e prisões.
No entanto, a ascensão de Eduardo III em 1330 trouxe algum alívio para Eleanor, que viu a restauração de certa normalidade após anos de caos. A partir de então, as vidas das irmãs Clare passaram a ser menos dramáticas. Eleanor faleceu em 1337, Margaret em 1342, e Elizabeth, após perder três maridos antes dos 26 anos, viveu uma vida prolongada como viúva, sobrevivendo a suas irmãs e morrendo aos 65 anos em 1360. Elizabeth, notável por sua resistência e resiliência, fundou uma faculdade na Universidade de Cambridge em 1338, chamada Clare, em homenagem à sua família e ao seu legado.