Wu Zetian (624-705) não é apenas uma figura intrigante na história da China; ela é uma das líderes mais complexas e controversas que o mundo já conheceu. Como a única mulher a governar a China por direito próprio em mais de três milênios, sua trajetória é marcada por audácia e ousadia. A história de Wu Zetian, uma mulher cuja ascensão ao poder foi marcada por intrigas e conflitos, desafia as normas e expectativas da sua época, criando um legado que continua a fascinar historiadores e estudiosos.
1. Da Concubina ao Poder Supremo
A história de Wu Zetian começa de maneira relativamente modesta. Nascida em uma família rica e bem educada, Wu Zetian foi incentivada a aprender sobre governança, literatura e artes, um privilégio raro para as mulheres de sua época. Seu pai, Wu Shiyue, assegurou que ela tivesse uma educação de qualidade, o que seria crucial para sua futura ascensão.
Aos 14 anos, Wu Zetian foi admitida no harém do Imperador Taizong (598-649) como uma concubina. No entanto, sua beleza e inteligência rapidamente chamaram a atenção do imperador, levando-a a desempenhar papéis mais proeminentes na corte, incluindo a posição de secretária do imperador. Em 655, após o falecimento de Taizong, ela manteve uma posição central ao atrair a atenção de seu sucessor, o Imperador Gaozong (628-683), com quem desenvolveu uma relação próxima.
2. O Caso Controverso com o Filho do Imperador
Com a morte de Taizong, Wu Zetian enfrentou um desafio significativo. Como era prática comum, concubinas do imperador falecido eram enviadas para um templo para viver em castidade. No entanto, Wu Zetian foi rapidamente convocada de volta à corte pelo novo imperador, Gaozong, após ele assumir o trono. Essa decisão foi um reflexo de sua influência e perspicácia política, pois Gaozong, seu amante e posteriormente marido, foi crucial para sua ascensão.
No entanto, a relação de Wu Zetian com Gaozong não foi isenta de controvérsias. Ela teve um relacionamento amoroso com o filho de Gaozong, Li Zhi, que mais tarde se tornaria o Imperador Zhongzong. Esse caso gerou especulações e rivalidades, e após a morte de Gaozong em 683, Wu Zetian não hesitou em manipular a sucessão imperial para manter o controle.
3. O Enigma do Bebê Morto e a Acusação de Assassinato
O drama e a violência marcaram a vida de Wu Zetian de várias maneiras. Em 654, após o nascimento de uma filha que morreu tragicamente, Wu Zetian acusou a Imperatriz Wang, esposa de Gaozong, de assassinato. A morte do bebê foi atribuída à ciúmes da imperatriz Wang, resultando em sua deposição. A acusação e a subsequente queda da imperatriz Wang levantam questões sobre o verdadeiro papel de Wu Zetian nessa tragédia. Alguns historiadores sugerem que Wu pode ter arquitetado a morte do próprio filho para incriminar Wang e fortalecer sua posição.
4. A Deposição de Filhos e a Ascensão ao Poder Absoluto
Após a morte de Gaozong, Wu Zetian tornou-se imperatriz viúva e seu filho Li Zhe assumiu o trono como Imperador Zhongzong. Contudo, Zhongzong mostrou sinais de independência e resistência ao controle materno, o que levou Wu a depô-lo e exilá-lo. Ela então colocou seu filho mais novo, Li Dan, no trono como Imperador Ruizong. Este, no entanto, foi mantido como uma figura decorativa, sem poder real.
Em um movimento audacioso, Wu Zetian depôs Ruizong em 690 e se proclamou “Imperatriz Reinante” (huangdi). Este foi um ato sem precedentes na história chinesa, desafiando as normas patriarcais e estabelecendo um novo modelo de governança.
5. A Dinastia Zhou: Uma Nova Era na História da China
Wu Zetian fundou a dinastia Zhou em 690, em homenagem à antiga dinastia Zhou (1046-256 a.C.). Embora seu governo tenha sido uma tentativa de criar uma nova era para a China, a história tradicional muitas vezes exclui a dinastia Zhou de Wu devido à sua natureza efêmera. A dinastia Zhou de Wu começou e terminou com ela, o que questiona sua validade como uma verdadeira dinastia no sentido tradicional.
6. Implacabilidade e Eliminação de Rivais
A busca de Wu Zetian pelo poder não foi sem custos. Ela eliminou vários rivais e adversários por meio de métodos brutais. Historicamente, há relatos de que Wu orquestrou assassinatos e suicídios forçados, incluindo a morte de seu próprio neto e neta. A lenda popular afirma que ela mandou mutilar o corpo da imperatriz Wang após sua deposição, jogando-o em uma cuba de vinho.
Wu Zetian utilizou uma combinação de terror e manipulação para consolidar seu poder, eliminando qualquer ameaça real ou percebida à sua posição. Sua crueldade e determinação a marcaram como uma figura implacável na história chinesa.
7. A Criação de uma Rede de Espionagem e Controle
Para manter sua posição, Wu Zetian estabeleceu uma sofisticada rede de espiões e uma força policial secreta. Esta rede permitiu-lhe monitorar possíveis conspirações e ameaças à sua autoridade. A instalação de caixas de correio de cobre fora dos edifícios governamentais incentivou a denúncia anônima, criando um sistema de vigilância que garantiu sua sobrevivência política.
8. Reputação Popular e Reformas
Apesar de sua reputação controversa, Wu Zetian também foi uma governante popular. Durante seu reinado, a China experimentou uma era de prosperidade econômica e estabilidade. Muitas de suas reformas foram bem recebidas pelo povo, pois vinham de sugestões populares. Wu Zetian promoveu a inclusão de plebeus no serviço governamental e fez aumentos salariais significativos para as camadas mais baixas da sociedade. Essas ações ajudaram a ganhar e manter o apoio popular, mostrando um lado mais benevolente de sua liderança.
9. Estratégias Militares e Diplomáticas
Wu Zetian não se destacou apenas pela sua habilidade política, mas também pela sua competência militar. Ela utilizou suas habilidades de liderança e diplomacia para expandir o território chinês, recapturando guarnições importantes que haviam sido perdidas para o Império Tibetano. Além disso, ela conseguiu reabrir a Rota da Seda, crucial para o comércio e a economia da China, após uma série de ataques e uma praga devastadora.
10. O Declínio e a Abdicação
No final dos anos 690, a influência de Wu Zetian começou a declinar. Seu envolvimento com dois jovens amantes, conhecidos como os irmãos Zhang, causou escândalo e descontentamento. Além disso, sua dependência de afrodisíacos exóticos e o assassinato dos irmãos Zhang pelos funcionários da corte indicaram uma perda de controle sobre a administração.
Em 704, sob pressão crescente, Wu Zetian foi forçada a abdicar em favor de seu filho exilado, o Imperador Zhongzong. Ela morreu no ano seguinte, encerrando um reinado que foi tanto revolucionário quanto controverso.
Wu Zetian deixou um legado complexo e multifacetado. Sua ascensão ao poder, governança e eventual queda mostram uma mulher que desafiou normas e expectativas em uma época dominada por homens. Sua história é um testemunho da habilidade de uma líder em moldar e dominar a política e a sociedade, apesar das dificuldades e adversidades. O impacto de Wu Zetian na história da China é indiscutível, e sua figura continua a provocar debate e fascínio entre historiadores e estudiosos ao redor do mundo.