Leitura de História

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História da Pena de Morte na Grã-Bretanha: Da Queda Longa à Abolição

Por muitos séculos, a pena de morte foi uma prática aceita e legal na Grã-Bretanha, refletindo as complexas mudanças sociais, culturais e políticas ao longo do tempo. A ameaça da pena capital na Grã-Bretanha pode parecer um resquício distante do passado, mas foi apenas em 1964 que as últimas execuções por crimes capitais foram realizadas. Este artigo explora a história da pena de morte na Grã-Bretanha, analisando suas várias formas, a evolução das atitudes sociais e o processo gradual de sua abolição.

A “Queda Longa” e o Método do Enforcamento

Desde o período anglo-saxão até o século XX, o enforcamento foi o método de execução mais prevalente na Grã-Bretanha. Inicialmente, a pena capital envolvia colocar um laço ao redor do pescoço do condenado e suspender a pessoa até a morte. Esta prática primitiva era frequentemente realizada em galhos de árvores, mas eventualmente evoluiu para estruturas mais elaboradas, como as forcas de madeira com escadas e carrinhos, onde os condenados eram suspensos até a asfixia.

No século XIII, o enforcamento passou a ser associado a um método de execução mais brutal conhecido como “enforcado, desenhado e esquartejado”. Este tipo de pena capital era reservado para crimes de traição, considerados crimes contra a coroa e a nação. O processo envolvia arrastar o condenado até o local da execução, enforcá-lo até quase a morte, e depois esquartejá-lo, com os membros ou a cabeça frequentemente exibidos publicamente como um aviso a outros potenciais criminosos.

No entanto, a prática de enforcamento passou por mudanças significativas ao longo dos séculos. No século XVIII, surgiu a prática conhecida como “nova queda” ou “queda longa”. Esse método foi introduzido pela primeira vez na Prisão de Newgate, em Londres, em 1783, e envolvia forcas projetadas para acomodar múltiplos condenados ao mesmo tempo. O método mais eficiente de causar a morte rápida, a “queda longa” , foi visto como mais humano do que a asfixia prolongada do enforcamento tradicional.

A Queima e o Desaparecimento do Desaparecimento

Embora o enforcamento tenha sido o método predominante, outras formas de pena capital também foram usadas. A queima na fogueira, por exemplo, era uma forma comum de execução para aqueles condenados por heresia no século XI e traição a partir do século XIII. A prática foi amplamente empregada durante o reinado de Maria I, que procurou restaurar o catolicismo na Grã-Bretanha. Aproximadamente 220 dissidentes protestantes foram queimados na fogueira sob seu governo, o que lhe conferiu o apelido de “Bloody Mary” (Maria Sangrenta).

Além disso, a queima também foi usada como uma forma de punição para mulheres condenadas por crimes que desafiavam a ordem patriarcal, como o assassinato do marido. As acusações de bruxaria, que afetam desproporcionalmente as mulheres, também resultaram em execuções por queima até o século XVIII na Escócia. No entanto, os nobres frequentemente escapavam desse destino cruel, pois a execução por decapitação, considerada mais rápida e menos dolorosa, era reservada para a elite. Figuras históricas notáveis, como Ana Bolena, Maria Rainha da Escócia e Carlos I, foram decapitadas, refletindo seu status social e a mudança nas práticas de execução.

O “Código Sangrento” e o Crescimento das Sentenças de Morte

Em 1688, o código penal britânico incluía 50 crimes puníveis com a morte. No entanto, até 1776, esse número havia quadruplicado para 220 crimes que poderiam resultar na pena capital. Esse aumento vertiginoso nas sentenças de morte durante os séculos XVIII e XIX é conhecido como o “Código Sangrento”. A maioria das novas leis desse código focava na proteção da propriedade, o que resultava em uma aplicação desproporcional da pena de morte aos pobres.

Crimes como “Grand Larceny”, que envolvia o roubo de mercadorias no valor de mais de 12 pence (aproximadamente um vigésimo do salário semanal de um trabalhador qualificado), eram passíveis da pena de morte. No entanto, com a chegada do final do século XVIII, os magistrados começaram a mostrar relutância em aplicar a pena capital para crimes que, segundo os padrões contemporâneos, eram considerados menos graves. Em vez disso, muitos condenados eram enviados para o transporte após a Lei de Transporte de 1717, sendo enviados através do Atlântico para trabalhar como trabalhadores contratados na América.

Com a rebelião americana na década de 1770, surgiram alternativas à pena capital e ao transporte. Grandes prisões foram estabelecidas, bem como colônias penais na Austrália. Além disso, uma campanha moralmente motivada para a abolição da pena de morte começou a ganhar força. Ativistas argumentam que causar dor era desumano e que a pena capital não oferecia aos criminosos uma chance de redenção, ao contrário da prisão.

O Movimento de Abolição e a Legislação

A Lei do Julgamento da Morte de 1823 refletiu uma mudança nas práticas e atitudes em relação à pena de morte. O ato restringiu a pena capital aos crimes de traição e assassinato. Gradualmente, ao longo da metade do século XIX, a lista de crimes capitais foi reduzida, e em 1861, apenas cinco crimes permaneciam sujeitos à pena de morte.

No início do século XX, outras restrições foram impostas. Em 1908, a pena de morte foi proibida para menores de 16 anos, e a idade foi elevada para 18 em 1933. Além disso, em 1931, as mulheres não podiam mais ser executadas por infanticídio após o parto. O debate sobre a abolição da pena de morte foi levado ao Parlamento britânico em 1938, mas a questão foi adiada até após o fim da Segunda Guerra Mundial.

O movimento de abolição ganhou força com vários casos controversos. O primeiro a atrair atenção foi a execução de Edith Thompson em 1923. Thompson e seu amante, Freddie Bywaters, foram enforcados por assassinar Percy Thompson, marido de Edith. A execução de Thompson gerou controvérsia devido ao fato de ser geralmente considerado repugnante enforcar mulheres, uma prática que não ocorria na Grã-Bretanha desde 1907. Rumores de que o enforcamento de Edith havia dado errado provocaram uma petição com quase um milhão de assinaturas contra a pena de morte. No entanto, o Secretário do Interior William Bridgeman não concedeu um adiamento.

Outra execução controversa foi a de Ruth Ellis em 1955, a última mulher a ser enforcada na Grã-Bretanha. Ellis atirou em seu namorado, David Blakely, após um período de violência e abuso. As circunstâncias do caso geraram simpatia pública e indignação, influenciando ainda mais a opinião contra a pena de morte.

O Fim da Pena Capital na Grã-Bretanha

Após a Segunda Guerra Mundial, a pena capital voltou a ser uma questão política e social importante. A eleição do governo trabalhista em 1945 também alimentou o crescente apelo pela abolição, uma vez que uma proporção maior de deputados trabalhistas apoiava a causa em comparação com os conservadores.

A Lei de Homicídios de 1957 restringiu ainda mais a aplicação da pena de morte a certos tipos de assassinato, como em casos envolvendo roubo ou a morte de policiais. Até então, a pena de morte era a sentença obrigatória para assassinato, apenas mitigada por adiamentos políticos.

Finalmente, em 1965, a Lei de Assassinato (Abolição da Pena de Morte) suspendeu a pena capital por um período inicial de cinco anos. Apoiada por todos os três principais partidos políticos, a lei foi tornado permanente em 1969. A sentença de morte por traição e pirataria foi abolida em 1998, tanto na prática quanto na lei, marcando o fim total da pena capital na Grã-Bretanha.

Essa jornada histórica, marcada por mudanças nas práticas legais e nas atitudes sociais, reflete uma evolução na forma como a sociedade britânica lida com a justiça e a moralidade. A abolição da pena de morte na Grã-Bretanha representa um marco importante na luta por direitos humanos e justiça, refletindo um compromisso crescente com métodos de punição mais humanos e reformistas.


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