Ah, a Profecia dos Papas, ou para os mais íntimos do mundo das conspirações medievais, a Profecia de São Malaquias. Se você nunca ouviu falar, prepare-se para uma viagem no tempo, recheada de intrigas clericais, previsões apocalípticas e, claro, um toque de manipulação política típica do século XVI — porque, convenhamos, a Igreja Católica nunca foi exatamente um mosteiro tranquilo cheio de monges entediados, certo?
Segundo a versão oficial, a profecia surgiu das mãos de São Malaquias, um arcebispo irlandês do século XII. Diz a lenda que o bom Malaquias teve uma visão durante uma visita a Roma, em 1139, onde Deus (ou alguém muito convincente) revelou uma lista com 113 frases enigmáticas, cada uma descrevendo um futuro Papa. A profecia começava com Celestino II (eleito em 1143) e seguia até um tal de Petrus Romanus, que seria o último papa antes do fim da Igreja e — pasmem — talvez do mundo como o conhecemos.
Mas, calma lá! Antes de colocar um capacete de alumínio e sair pregando o apocalipse, vamos entender como essa história chegou até nós.
Arnold Wion: O Monge que Lançou a Profecia ao Mundo
A primeira publicação da Profecia dos Papas foi feita só em 1595, mais de 400 anos depois da morte de São Malaquias. O responsável por divulgar esse texto foi Arnold Wion, um monge beneditino que incluiu a profecia em sua obra Lignum Vitae. E aqui já começamos a entrar na parte suspeita da história.
Por que uma profecia tão espetacular ficou guardada por séculos antes de ser publicada? A resposta, meu caro leitor, pode estar na política eclesiástica da época. Em 1590, a Igreja estava no meio do Segundo Conclave para eleger um novo papa. A profecia surgiu justamente nesse contexto, coincidindo perfeitamente com a candidatura do cardeal Girolamo Simoncelli, que muitos acreditam ter sido favorecido pela descrição profética.
Segundo historiadores como Claudio Rendina e Francis Burkle-Young, a profecia pode ter sido escrita para influenciar a eleição papal, pintando Simoncelli como a escolha “divina”. Afinal, nada como uma boa profecia para convencer os indecisos, não é?
Acurada ou Manipulada? A Questão da Exatidão Histórica
Um dos pontos mais intrigantes (ou reveladores) sobre a Profecia dos Papas é que as descrições dos pontífices até 1590 são assustadoramente precisas. Por exemplo, o lema atribuído ao Papa Celestino II é Ex castro Tiberis (“Do castelo do Tibre”), que parece se referir ao local de nascimento do papa próximo ao rio Tibre.
Porém, quando analisamos as frases que se referem aos papas posteriores a 1590, a precisão desaparece como um milagre às avessas. As descrições se tornam vagas, genéricas e facilmente adaptáveis a qualquer situação. Isso levou a maioria dos historiadores — e até alguns teólogos — a concluir que as profecias foram forjadas pouco antes de serem publicadas, servindo como propaganda política disfarçada de revelação divina.
Petrus Romanus: O Último Papa e o Fim dos Tempos?
Agora chegamos ao ponto mais polêmico e, claro, o mais midiático da profecia: Petrus Romanus, o último papa. Segundo o texto, ele seria o responsável por guiar a Igreja durante tempos de grande tribulação, culminando na destruição de Roma e, possivelmente, no apocalipse.
“Na última perseguição à Santa Igreja Romana, reinará Pedro, o Romano, que apascentará o seu rebanho entre muitas tribulações; após as quais a cidade das sete colinas será destruída, e o temível juiz julgará o seu povo.”
Esse trecho final gerou uma série de teorias conspiratórias ao longo dos séculos, algumas mais fantasiosas do que outras. Recentemente, alguns “profetólogos” tentaram associar Petrus Romanus ao Papa Francisco, argumentando que seu nome de batismo, Jorge Mario Bergoglio, teria uma conexão simbólica com São Pedro. Claro, essas interpretações são altamente especulativas e carecem de qualquer base sólida, mas não deixam de alimentar o fascínio popular.
Profecia ou Propaganda?
Ao longo dos séculos, a Profecia dos Papas se tornou um prato cheio para teóricos da conspiração, escritores e cineastas. De obras de não ficção como The Last Pope de John Hogue a documentários sensacionalistas, o tema continua a capturar a imaginação coletiva. Mas a verdade é que não há qualquer evidência de que São Malaquias tenha realmente escrito essas frases.
A maior parte dos acadêmicos vê a profecia como uma construção histórica, possivelmente criada para atender a interesses políticos específicos durante o século XVI. O historiador Bernard McGinn, especialista em misticismo cristão, afirma que o texto provavelmente foi concebido como uma forma de influenciar a opinião pública e os cardeais no conclave de 1590.
Referências Bibliográficas
- McGinn, Bernard. Visions of the End: Apocalyptic Traditions in the Middle Ages. Columbia University Press, 1998.
- Rendina, Claudio. The Popes: Histories and Secrets. Seven Locks Press, 2002.
- Burkle-Young, Francis. The Election of Pope John Paul II. Lexington Books, 1999.
A Profecia dos Papas é um exemplo fascinante de como história, religião e política se entrelaçam para criar narrativas que desafiam nossa percepção da verdade. Embora o texto tenha sido desmascarado como uma provável fraude histórica, seu impacto cultural e seu mistério permanecem vivos até hoje. Afinal, quem não gosta de uma boa história de conspiração e apocalipse para apimentar a vida?