Leitura de História

A Coroação de Carlos III e o Retorno da Pedra do Destino

A coroação de Carlos III traz à tona a fascinante história da Pedra do Destino, símbolo de tradição e resistência entre Escócia e Inglaterra.

A história da monarquia britânica está repleta de eventos marcantes, mas poucos são tão simbólicos quanto uma coroação. Em 6 de maio de 2023, a Grã-Bretanha será palco de um momento histórico: a coroação do rei Carlos III, marcada para acontecer na icônica Abadia de Westminster, em Londres. Esta será a primeira coroação desde 1953, quando a rainha Elizabeth II, mãe de Carlos, foi coroada. No entanto, o que torna este evento particularmente intrigante é o retorno de um artefato ancestral, a Pedra do Destino, um dos objetos mais enigmáticos e carregados de simbolismo da história britânica e escocesa.

Um Contexto de Tradição e Modernidade

A monarquia britânica, ao longo dos séculos, manteve-se como um alicerce cultural e político, adaptando-se às demandas da sociedade moderna. Para Carlos III, que assumiu o trono após o falecimento de Elizabeth II em 2022, esta coroação promete ser mais contida e inclusiva, refletindo os novos tempos. Contudo, mesmo em meio às mudanças, tradições antigas permanecem. Um exemplo é o uso da Pedra do Destino, também conhecida como Pedra de Scone, peça central em cerimônias de coroação desde tempos imemoriais.

A Pedra do Destino: Símbolo de Poder e Conquista

A Pedra do Destino, um bloco de arenito vermelho pesando 152 quilos, carrega consigo séculos de história. Suas origens exatas permanecem envoltas em mistério, mas as lendas que a cercam são tão fascinantes quanto significativas. De acordo com o folclore escocês, a pedra teria sido usada na coroação de reis escoceses por séculos antes de ser levada para a Inglaterra. Alguns acreditam que ela tem origem bíblica, sendo identificada como a pedra que Jacó usou como travesseiro em sua visão da escada celestial descrita no livro do Gênesis.

Segundo a tradição, a pedra teria sido levada para a Irlanda por figuras míticas, como o profeta Jeremias, e posteriormente transferida para a Escócia por Fergus, o primeiro rei dos escoceses, no século VI. Inicialmente abrigada na Ilha de Iona, a pedra chegou a Scone, onde se tornou um elemento essencial das coroações escocesas.

A Pedra e os Conflitos Anglo-Escoceses

A simbologia da Pedra do Destino não passou despercebida aos conquistadores ingleses. Em 1296, durante a Primeira Guerra da Independência Escocesa, o rei Eduardo I da Inglaterra capturou a pedra e a levou para Londres, onde foi colocada sob a Cadeira da Coroação na Abadia de Westminster. Esse gesto foi tanto um ato de dominação política quanto cultural, representando o poderio inglês sobre a Escócia.

No entanto, a relação entre os dois países permaneceu marcada por tensões. A pedra, que simbolizava a soberania escocesa, tornou-se alvo de disputas. Em 1950, estudantes escoceses roubaram o artefato de Westminster, levando-o de volta para a Escócia. O episódio, retratado no filme A Pedra do Destino (2008), tornou-se um símbolo de resistência e orgulho nacional. Finalmente, em 1996, o governo britânico devolveu oficialmente a pedra à Escócia, onde permanece no Castelo de Edimburgo, com a condição de retornar a Londres apenas para coroações.

A Cadeira da Coroação: Um Trono de História

Outro elemento central das coroações britânicas é a Cadeira de Santo Eduardo, onde a Pedra do Destino é colocada. Com quase dois metros de altura e ricamente ornamentada, esta cadeira foi construída para Eduardo I e utilizada em coroações desde então. Para Carlos III, sentar-se nela representará não apenas a continuidade da tradição, mas também um momento de transição em um contexto político e social desafiador.

Significados e Reflexões

A coroação de Carlos III será, sem dúvida, um evento memorável, mas também uma oportunidade para refletir sobre o papel da monarquia em tempos modernos. A Pedra do Destino, com suas camadas de história, lendas e conflito, exemplifica a complexa relação entre tradição e mudança. Como ressaltou Richard Welander, chefe de coleções do Historic Environment Scotland:

“A Pedra do Destino é verdadeiramente única, nenhum outro objeto como esse continua a cativar e intrigar o público em igual medida.”

Para a Escócia, a pedra permanece um ícone de identidade nacional; para a Inglaterra, um testemunho das interconexões históricas; e, para o mundo, um símbolo da continuidade de rituais que ultrapassam séculos.

Uma Herança Compartilhada

O retorno temporário da Pedra do Destino para a coroação de Carlos III não é apenas um gesto protocolar, mas um lembrete da interdependência histórica entre Escócia e Inglaterra. Mais do que um artefato, a pedra simboliza as complexas tramas de poder, cultura e identidade que moldaram o Reino Unido. Sua presença na Abadia de Westminster reitera que, mesmo em tempos de transformação, o peso da história permanece como um elo inquebrantável entre passado e presente.


Confira a seguir o trailer do filme ‘A Pedra do Destino’.

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