Massada, a fortaleza judaica no deserto da Judeia, simboliza a resistência contra Roma e o sacrifício dos Sicários. Uma história de tragédia e coragem.
Nas profundezas do deserto da Judeia, em Israel, repousam as ruínas de uma fortaleza que, durante o século I, testemunhou um dos episódios mais dramáticos da história antiga. Massada, erguida sobre um imponente platô rochoso com vista para o Mar Morto, tornou-se símbolo de resistência e tragédia. Hoje, suas ruínas não apenas nos conectam ao passado, mas também levantam questionamentos sobre a coragem, a luta e o sacrifício humano.
A Revolta Judaica Contra Roma
O conflito que culminaria em Massada começou em 66 d.C., quando a província romana da Judeia se levantou em revolta contra o poderio de Roma. Este movimento marcou o início da Primeira Guerra Judaico-Romana, uma revolta feroz e desesperada em busca de autonomia frente ao império mais poderoso da época. A guerra, marcada por sucessos iniciais dos judeus, logo mudou de rumo com a chegada do general romano Vespasiano. Ele, com táticas implacáveis e legiões disciplinadas, começou a esmagar a resistência judaica.
Em 70 d.C., Jerusalém foi capturada e o Segundo Templo, símbolo central da cultura e religião judaicas, foi destruído. A destruição de Jerusalém foi um golpe devastador para os judeus, mas ainda restava uma fortaleza rebelde: Massada. O que a tornava especial não era apenas sua localização estratégica e inacessível, mas o fato de abrigar o grupo extremista conhecido como os Sicários, cuja história ajudaria a transformar Massada em um ícone cultural e religioso.
As Origens da Fortaleza de Massada
Muito antes de se tornar o bastião da última resistência judaica, Massada foi utilizada por Herodes, o Grande, como uma fortaleza e refúgio. Herodes, que reinou sobre a Judeia como um cliente de Roma entre 37 e 4 a.C., construiu ali um complexo palaciano luxuoso. Ele sabia que Massada, com seus penhascos vertiginosos de até 400 metros e a inacessível Trilha da Serpente, era praticamente inexpugnável. Herodes adicionou muralhas, torres e portões que tornavam qualquer tentativa de invasão extremamente difícil.
Além de sua função militar, o palácio de Herodes em Massada contava com três níveis e incluía banhos romanos e uma piscina, uma demonstração clara do luxo que Herodes desfrutava. Este complexo servirá como palco para o drama final da resistência judaica, décadas depois da morte de Herodes.
Os Sicários e a Tomada de Massada
No início da Primeira Guerra Judaico-Romana, em 66 d.C., os Sicários, um grupo extremista judeu conhecido por sua oposição radical tanto aos romanos quanto aos judeus que colaboravam com o império, tomaram a fortaleza de Massada. Este grupo, liderado por Eléazar ben Yaïr, usava táticas de guerrilha e era conhecido por atacar e matar judeus considerados colaboracionistas. Durante anos, os Sicários resistiram nas fortalezas remotas, transformando Massada em seu refúgio final.
Dentro da fortaleza, eles estabeleceram uma comunidade e utilizaram os vastos recursos deixados por Herodes. O suprimento de água era garantido pelas grandes cisternas e cavernas subterrâneas, projetadas para armazenar milhares de litros de água, essenciais para sustentar os quase mil Sicários e suas famílias que viviam no local.
O Cerco de Massada
A resistência dos Sicários incomodava profundamente os romanos, que, após a queda de Jerusalém, desejavam eliminar os últimos focos de rebelião na Judeia. Em 72 d.C., Lúcio Flávio Silva Basso, o governador romano da província, marchou com uma legião de cerca de 10.000 soldados para cercar Massada. A Trilha da Serpente, com sua estreita passagem, impossibilitava um ataque direto. Portanto, os romanos começaram a construir uma rampa de cerco gigantesca do lado oeste do planalto, um projeto monumental que envolveu a movimentação de milhares de toneladas de pedra e terra.
Durante meses, os defensores de Massada atiram projéteis sobre os soldados romanos que trabalhavam na construção da rampa. No entanto, o exército de Silva foi implacável. Eventualmente, eles concluíram a obra, permitindo a aproximação de uma torre de cerco equipada com um aríete, pronto para derrubar as muralhas da fortaleza.
A Tragédia Final: Suicídio Coletivo
Quando os romanos finalmente derrubaram as muralhas de Massada, esperavam enfrentar uma última e feroz resistência. No entanto, encontraram silêncio e desolação. Ao invés de se renderem à escravidão ou à morte nas mãos dos romanos, os Sicários tomaram uma decisão trágica. Em um discurso inflamado, Eléazar ben Yaïr convenceu seus seguidores de que a morte seria preferível à captura. Em um ato de fanatismo, os Sicários decidiram cometer suicídio coletivo. Sorteando alguns homens para matarem os demais, esses últimos tiraram suas próprias vidas.
Quando os romanos finalmente entraram em Massada, apenas duas mulheres e cinco crianças sobreviveram, escondendo-se em cavernas para relatar o ocorrido. Além disso, os Sicários destruíram todos os seus suprimentos, uma última declaração de independência e desafio ao poder romano.
Massada não é apenas um sítio arqueológico. Hoje, as ruínas da fortaleza servem como um poderoso símbolo de resistência. O sacrifício dos Sicários foi transformado, ao longo dos séculos, em um ícone da bravura e do espírito de luta do povo judeu. Para muitos, Massada representa a luta desesperada pela liberdade; para outros, é um exemplo trágico do que ocorre quando o extremismo e a falta de disposição para negociar dominam.
Até os dias atuais, Massada ocupa um lugar especial na identidade israelense. Membros das Forças de Defesa de Israel (IDF) frequentemente realizam suas cerimônias de posse no topo do planalto, onde declaram: “Massada não cairá novamente”. Este juramento encapsula tanto a reverência quanto a lição histórica que Massada traz à nação moderna.
Descobertas Arqueológicas e O Sítio de Massada Hoje
Desde o século XX, escavações arqueológicas têm revelado mais sobre a vida em Massada. Fragmentos de cerâmica, conhecidos como ostraca, usados pelos Sicários para sortear os homens que cometeram os atos finais, foram encontrados, assim como as fundações da sinagoga e os vastos sistemas de armazenamento de água.
Massada permanece um testemunho físico e espiritual da herança judaica e das complexidades da resistência humana. Hoje, turistas de todo o mundo visitam suas ruínas, subindo pela Trilha da Serpente ou utilizando o teleférico moderno que facilita o acesso. De lá, eles contemplam não só a vasta beleza do deserto e do Mar Morto, mas também a memória de um sacrifício que ecoa através dos milênios.